Texto aprovado na última segunda-feira (24/05) reflete novo espírito que deve nortear as atividades na arrancada para o segundo século da ACL.

José Isaac Pilati 

Cadeira 14 da ACL

Na noite de 24 de maio de 2021, a Academia Catarinense de Letras discutiu e aprovou uma reforma estatutária que há muito se impunha. O texto aprovado, como a reunião em si e demais atividades do ano sob a nova diretoria, denotam novo espírito, a nortear a arrancada para o segundo século na Casa José Boiteux. As sessões de saudade para Carlos Ronald, Edson Ubaldo e João Nicolau de Carvalho, com as famílias e amigos dos confrades que partiram, são exemplo daquela amizade comunitária congregada na sabedoria, a que se referia Epicuro: a forma imperecível de troca entre os amigos perecíveis: uma dança em torno do mundo.

A sessão de saudade não concorre com prática ou crença religiosa; é posterior e à imagem e semelhança de uma totalidade – do confrade, do sodalício e do imponderável: insculpe-se entre o humano e o demasiado. A sessão resgata as facetas do amigo pranteado, na vida e na arte, na família e na amizade do mundo. Há o discurso oficial da Academia e testemunhos dos confrades; depois falam as autoridades, os amigos, e finalmente a família, tudo sob a tenda da hospitalidade mortuária: a última presença na Cadeira. Ao final, sopra-se a vela e está aberta a sucessão. Como diria Fernando Pessoa, a morte não foi uma queda, mas um passo de dança.

Já a discussão do estatuto foi um mutirão. O trabalho da Comissão presidida por João José Leal incorporara as contribuições dos confrades, num esforço conjunto de habilitar a ACL para arrostar novos tempos rumo ao segundo centenário. O debate foi mais intenso em torno de duas propostas: renúncia e jubilação acadêmica. A jubilação, se aprovada, formaria um quadro a parte, liberando de imediato a Cadeira. Foi rejeitada. A ACL formaria um todo, é verdade, interessante à primeira vista; mas um todo com partes – ela deixaria de ser inconsútil na essência, inteiriça. Em latim: cuncta. E em suma, a jubilação é substancialmente renúncia.

A renúncia à condição de acadêmico foi defendida com argumentos de ordem constitucional: ninguém é obrigado a permanecer associado. Juridicamente, é uma declaração receptícia de vontade: não é unilateral, é dirigida ao sodalício. A Academia Brasileira de Letras nunca aceitou tal pedido, porque atenta contra a imortalidade; esta, que pela própria natureza, não se pauta pelo direito das obrigações, e sim pelo pacto institucional originário, incompatível com a finitude civil. Um exemplo é o pacto da seccessio plebis romana: por ele os plebeus obtiveram estatuto constitucional paralelo, com prerrogativa de veto pela sua própria assembleia.